sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Atletismo na escola: uma possibilidade de ensino

Introdução
 
    O atletismo é um esporte que na maioria das vezes é negligenciado na Educação Física escolar. Os motivos que levam a esta afirmação são vários, conforme se pode confirmar com Lencina (1999, p. 78) "os professores da rede escolar de Santa Maria apontam a falta de infra-estrutura física das escolas como um dos principais motivos pelo desinteresse em trabalhar o atletismo nas aulas de Educação Física".
    Na cultura da sociedade atual, os esportes contemplam um alto grau de importância como prática social. Ao fazer esta consideração tem-se presente que hierarquicamente entre as modalidades esportivas, a que possui maior relevância como prática esportiva e social é o futebol, conforme afirma Ramos (1984, p. 48), "o futebol será um esporte como os demais. Apaixonar-se emerge de sua fetichização. Atribuem-lhe um valor inexistente para utilizá-lo como instrumento de despolitização".
    Pode-se afirmar que nesta classificação cultural esportiva e social dos esportes, o atletismo figura entre as últimas posições. Esse aspecto deve ser considerado inicialmente sob duas perspectivas: a primeira referindo-se as possibilidades que teria o atletismo se possuísse maior espaço na cultura esportiva, o que despertaria um interesse crescente pela modalidade, um "gosto popular". Para Singer (1986, p. 186) "a popularidade de um certo esporte em uma sociedade em particular pode muito bem influir sobre as atitudes e preferências da juventude"; a segunda refere-se a primeira e se relaciona com o fato do atletismo ser pouco reconhecido em termos de espaços, ou seja, incentivos e apoios, oportunidades e trabalhos desenvolvidos, tanto no meio escolar como em clubes e comunidades em geral.
    Considerando as diversas problemáticas que envolvem o ensino desse esporte na escola, dar-se-á, neste trabalho, ênfase ao processo de ensino-aprendizagem do atletismo enquanto conteúdo em contexto escolar e em cursos de Educação Física de ensino superior, apontando novos caminhos para sua concretização enquanto uma possibilidade de movimento, desvinculando-o da tradicional maneira de compreendê-lo.
    Sabe-se que nas orientações didáticas adotadas para o ensino do atletismo na universidade e na escola, prioriza-se, principalmente, desenvolver as provas atléticas com base no esporte institucionalizado, observando suas regras e normas oficiais de competição, tornando-o pouco atrativo e interessante, especialmente para aqueles que são caracterizados como "menos habilidosos".
    Assim, a modalidade de atletismo normalmente é "deixada de lado", pois ensiná-lo representa, conforme Kunz (1998, p. 23) um processo dramático. O mesmo autor afirma ainda "os alunos preferem mil vezes jogar, brincar com a bola, do que saltar em altura, distancia ou arremessar ou se 'matar" numa corrida de quatrocentos metros".
    Kunz (1998, p. 23) complementa dizendo:
A preferência por atividades jogadas não esta somente na falta de ludicidade como de apresentam as chamadas "provas" de atletismo, mas na maioria dos casos, por lembranças de insucesso ou de uma vivencia não bem sucedida pelos parâmetros normais como essas provas se apresentam.
    Em relação à disciplina de atletismo nos cursos de Educação Física de ensino superior, observa-se um baixo interesse dos acadêmicos para com este esporte. Dentre outros argumentos já mencionados, os acadêmicos não vêem sentido ou aplicação dos conteúdos em relação à sua futura atuação profissional. Decorre daí, uma série de dificuldades no processo de ensino-aprendizagem, sendo que a forma como este esporte é abordado em contexto acadêmico repercute diretamente na maneira como ele é apresentado pelo profissional de Educação Física em contexto escolar.
    A disciplina de Esporte Individual III do curso de Educação Física da Universidade Federal de Santa Maria, apresenta algumas competências que devem ser adquiridas pelos acadêmicos, principalmente no que diz respeito ao futuro exercício profissional, a saber:
  • a aprendizagem das provas do atletismo enquanto cultura de movimento já consolidada. Assim se deve dominar o conteúdo teórico específico que forma a base dessa cultura de movimento.
  • O desenvolvimento da capacidade de ensinar atletismo, principalmente na escola que envolve o fazer e o agir dentro de exigências pedagógicas.
    Essas duas exigências básicas a serem cumpridas pela disciplina, uma em relação à aprendizagem prática das provas de atletismo que inclui seu conteúdo teórico, e a outra em relação ao ensino, principalmente na escola, não se excluem, pelo contrário, complementam-se, embora a segunda implique em reflexões pedagógicas mais profundas.
    Dessa maneira, delineou-se o presente trabalho tendo como objetivos proporcionar aos acadêmicos do curso de Educação Física/UFSM vivências práticas de ensino e aprendizagem do atletismo junto às escolas da comunidade Santa-mariense bem como oportunizar a vivência dessa modalidade à escolares de escolas públicas dessa cidade.
    O presente trabalho é decorrente dessa proposta e se propõe a relatar a realização dessa experiência em uma das escolas envolvidas no trabalho.

Metodologia 
 
    O trabalho foi iniciado com estudos teóricos realizados na disciplina de esporte individual III, envolvendo tanto aspectos referentes as diferentes provas que compõem o atletismo como também metodologias de ensino.
    O desenvolvimento da parte prática de ensino-aprendizagem foi realizado com escolares entre 9 e 11 anos da Escola Municipal de Ensino Fundamental Vicente Farencena de Santa Maria/RS.
    Foi realizado o contato com a direção da escola apresentado os objetivos do projeto de atletismo na escola; logo, após a autorização da direção, estabeleceu-se o contato com a turma disponibilizada, também apresentado o projeto à turma e à professora responsável. E após demonstrarem interesse em participar do projeto, combinou-se os dias e horários para a realização das aulas.
    O período que envolveu a parte prática na escola foi entre os meses de setembro e novembro de 2004, sendo que foram realizadas duas aulas semanais de 50 minutos.
    Na realização das aulas, utilizou-se de atividades lúdicas e recreativas enfocando os movimentos básicos do atletismo: correr, saltar, lançar e arremessar.
    Destaca-se que no período em que ocorreram as aulas na escola, mantiveram-se as aulas regulares da disciplina de Esporte Individual III no curso de Educação Física/CEFD/UFSM, sendo que estas foram espaços privilegiados para troca de experiências entre colegas da turma, discussão de textos para sustentar o trabalho prático e teórico, orientações da professora responsável pela disciplina e orientadora do trabalho, enriquecendo as vivencias e possibilitando qualidade no trabalho que estava sendo realizado.

Ensino-aprendizagem do atletismo e aspectos didáticos
 
    A iniciação ao atletismo - visto como um conjunto de habilidades específicas - constitui a primeira fase do processo ensino-aprendizagem desta modalidade, utilizando-se das formas básicas de correr, saltar, lançar e arremessar.
    Na atual cultura esportiva que normalmente coloca a competição e a vitória, ou seja, o produto, como o que se tem de mais importante, não é possível negar a relação do esporte atletismo com o rendimento, implícita na prática do atletismo convencional. Porém, é impossível negar os processos intermediários e, tratando-se de contexto escolar, deve-se trabalhá-lo em seu potencial e sua adaptabilidade à interpretação recreativa e lúdica, tão ou até mais ampla que a tradicional, reconhecendo o fato de que a maioria dos escolares não atinge o nível de atleta.
    Para Costa (1992) o atletismo a ser utilizado na escola deve ser considerado como o "pré-atletismo", onde, numa primeira fase, faz-se através dos gestos motores básicos correr, saltar, lançar e arremessar; e numa segunda fase, mantêm-se os da primeira, avançando-se para as tarefas que exigem uma maior codificação dos gestos motores básicos, aproximando progressivamente a criança do Atletismo.
    Correr, saltar, lançar e arremessar são as habilidades físicas de base, estão presentes em quase todas as modalidades esportivas. Como ações motoras naturais, significam uma função da natureza humana. Por isso, em si, os movimentos atléticos não são desinteressantes. O que pode torná-los assim é a sua interpretação e sistematização didática vinculadas somente ao atletismo institucionalizado.
    Assim, propõe-se o processo de ensino-aprendizagem do atletismo vinculado à aspectos lúdicos, onde o brincar permita o desenvolvimento das capacidades motoras básicas, possibilitando a aprendizagem do atletismo e a vivencia de diferentes situações permitidas pelo brincar, favorecendo desenvolvimento integral da criança (escolar).
    De acordo com Moyles (2002), brincando a criança desenvolve confiança em si mesma e em suas capacidades, levando-a a desenvolver percepções sobre as outras pessoas e a compreender as exigências bidirecionais de expectativa e tolerância. O ato de brincar proporciona as crianças a oportunidade de explorar conceitos como liberdade existentes implicitamente em muitas situações lúdicas favorecendo o desenvolvimento de sua independência. O brincar oferece situações em que as habilidades podem ser praticadas, tanto as físicas quanto as mentais, e repetidas tantas vezes quanto for necessário para obter confiança e domínio, além de permitir a exploração de seus potenciais e limitações.
    Destaca-se ainda que a utilização do lúdico no processo de ensino-aprendizagem do atletismo ganha dimensão em importância no contexto escolar por possibilitar a participação de todos, independente do seu atual desenvolvimento motor e também por se caracterizar como sendo uma atividade prazerosa, que possibilita alegria e prazer na sua realização.

Contextualização e desenvolvimento das aulas
 
    O trabalho foi iniciado com conhecimento e reconhecimento do atletismo pelos alunos participantes. Através de conversas sobre o atletismo, delineou-se qual o conhecimento que os escolares apresentavam sobre esta modalidade esportiva.
    Percebeu-se que o conhecimento destes estava vinculado ao esporte atletismo institucionalizado, com regras e normas dirigidas pelas competições, sem nenhuma flexibilidade.
    Diante dessa realidade propôs-se um desafio a turma: aprender o atletismo de uma maneira diferenciada, onde todos, independente de suas qualidades físicas poderiam participar e aprender.
    Outra proposta foi a adaptação das aulas ao espaço físico disponível na escola. Grande parte dos escolares consideravam que não eram capazes de aprender e praticar atletismo e também que na escola seria muito difícil, uma vez que não havia um espaço adequado para a prática segundo suas concepções.
    Buscou-se apoio bibliográfico em Kunz (1998) que em sua obra "Didática da Educação Física" propõem uma transformação didático-pedagógica do atletismo, sendo que aborda nesta obra uma estratégia didática através de um exemplo concreto de ensino e oferece ao professor de Educação Física possibilidades para que possa refletir na elaboração e desenvolvimento das aulas de atletismo.
    E, a partir do que Kunz (1998) apresentou em sua obra delineou-se as ações práticas das aulas de atletismo desenvolvidas, a saber:
  • o aluno foi colocado no centro do desenvolvimento das ações de aprendizagem, sendo que suas opiniões e interesses eram levados em consideração na construção das atividades;
  • os alunos não eram considerados meros executores das atividades propostas, mas descobridores e inventores, criando formas de um "se movimentar" a partir das relações situacionais-individuais e também situacionais de relações aluno-professor e aluno-aluno;
  • o correr, saltar, lançar e arremessar foram propostos como possibilidades pedagógicas para um "se-movimentar" atrativo e prazeroso e de significados individuais e coletivos.
    A prática inicialmente proposta partiu de um princípio de desconstrução de imagens, ou seja, aquelas imagens que o aluno internalizou através dos contatos que teve com atletismo, seja assistindo competições na televisão, seja participando e onde só poderia obter êxito aquele que apresentava uma excelente condição natural de força, velocidade e resistência orgânica ou a partir de um enorme investimento na melhoria dessas capacidades físicas e só poderia ser realizado dentro de um espaço físico oficial.
    Realizaram-se diversas atividades, conhecidas e sugeridas pelos alunos e que envolviam a corrida. Todos participaram com êxito e satisfação. Ao final , em momento de conversa e reflexão sobre a aula, fez-se compreender que foi praticado atletismo, uma vez que correr era um dos movimentos básicos enfocados nesse esporte.
    A partir dessa prática, iniciou-se a construção conjunta das aulas, sendo que correr era a atividade preferida dos alunos em geral. Foram realizadas diversas e diferentes brincadeiras envolvendo corridas, desde jogos competitivos e cooperativos até corridas individuais e coletivas e que repercutiram muitas melhorias nas capacidades motoras envolvidas no correr.
    Desde o início das aulas, os alunos já demonstraram seu interesse pelo esporte futebol e, como seus interesses foram sempre considerados importantes, justificou- se a prática do atletismo como também uma possibilidade para melhorias no jogo de futebol. Propuseram-se reflexões em busca de relações, onde os próprios alunos perceberam que o atletismo é de fundamental importância para a melhora nas capacidades físicas utilizadas nos demais esportes. Também, proporcionou-se em momentos finais das aulas pequenos jogos de futebol modificado, como por exemplo, futebol em corrente e futebol em dupla, estimulando a participação e interesse de todos.
    Na seqüência, o movimento saltar tornou-se objetivo direcionador das práticas realizadas nas aulas. Os alunos foram convidados a relatar e propor diferentes situações de dia-a-dia onde usavam-se de saltos. Surgiram diferentes situações que foram encenadas pelo grande grupo e também em pequenos grupos que as apresentavam à todos na seqüência. Brincadeiras envolvendo saltos em distancia e altura e diferentes desafios foram criados e vivenciados pelos alunos.
    O lançar e arremessar foi trabalhado com a utilização da pelota. Os próprios alunos construíram-na, percebendo dessa maneira que materiais alternativos poderiam oferecer possibilidades de movimentos quando se pensava que era necessário ter aqueles materiais convencionais utilizados na prática do atletismo como o peso, o disco e o martelo.
    Novamente aspectos lúdicos e recreativos tomaram espaço nas aulas. Diferentes jogos e brincadeira possibilitaram experimentar o "se movimentar" proporcionado pelo lançamento e arremesso.
    Na escola onde este trabalho foi desenvolvido não havia a disciplina de Educação Física como disciplina regular obrigatória oferecida aos alunos e, dessa maneira a prática proposta pelo projeto desenvolvido junto aos alunos, era o único momento em que estes tinham possibilidades de "se movimentar" e se descobriram enquanto seres de movimento. Este fato repercutiu, em alguns momentos de forma positiva, quando os alunos valorizam este espaço de forma singular; noutros foi fator de dificuldade, pois os alunos mostravam-se agitados e ansiosos pela aula, não a aproveitando de maneira integral como poderiam.

Considerações finais 
 
    Ao concluir as atividades, os próprios escolares demonstraram que foram capazes de aprender e praticar aulas de atletismo de maneira satisfatória, uma vez que o aspecto lúdico presente em todas as aulas permitiu grande participação e interesse por parte destes.
    Percebeu-se que de modo geral os escolares melhoraram significativamente seu desempenho motor e qualidades físicas sendo que também mudaram sua imagem e concepção de atletismo, não abandonando aquela maneira tradicional de vê-lo, mas percebendo que existem outras possibilidades de aprendê-lo e vivenciá-lo.
    Da mesma maneira, esta prática proporcionou para os acadêmicos envolvidos no desenvolvimento das aulas uma experiência única, pois mostrou a possibilidade de trabalhar o atletismo de uma forma diferenciada, quebrando tabus de métodos tradicionais e mostrando que através da ludicidade é possível obter ótimos resultados e possibilitar experiências muito significativas para o universo de movimentos dos escolares.

Referências bibliográficas
  • KUNZ, E. Didática da Educação Física. Ijuí: Unijuí, 1998.
  • LENCINA, L. A. Diagnóstico do Atletismo Escolar em Santa Maria. Monografia de Especialização, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, 1999.
  • MIOTTI, I. M. L. Reflexões sobre o conceito de movimento na formação profissional em Educação Física: uma experiência com o Atletismo. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, 2002.
  • RAMOS, R. Ideologia do Poder. Petrópolis: Ed. Vozes Ltda, 1984.
  • SINGER, R. N. & DICK, W. Ensinando Educação Física: uma abordagem Sistêmica. Porto Alegre: Ed. Globo, 1980.
  • MOYLES, Janet R. Só brincar? O papel do brincar na educação infantil - Porto Alegre: Artmed, 2002.
  • COSTA, A. Atletismo. In: Educação Física na escola primária. Volume II. Iniciação Desportiva. Porto: Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física, 1992. 

    Bibliografia das autoras
    *Professora de EF e Mestranda na Universidade Federal de Santa Catarina.
    **Professora Especialista em EF Escolar.
    ***Professora Mestra de EF, professora da FAMES e orientadora do trabalho.
    (Brasil)

    Simone Teresinha Meurer*
    Rubia Jaqueline Schaefer**
    Ivana Maria Lambertti Miotti***

Principais Alterações Fisiológicas no Idoso

Alterações Gerais

Com o envelhecimento, a estatura diminui cerca de 1cm por década. Essa perda deve-se à redução dos arcos dos pés, aumento da curvatura da coluna vertebral, além da diminuição do diâmetro dos discos intervertebrais. Os diâmetros da caixa torácica e do crânio tendem a aumentar com o envelhecimento.
O teor total de água corpórea diminui por perda de água intracelular. O potássio total, íon potencialmente intracelular, também diminui. No geral, ocorre redução do número de células em todos os órgãos, sendo os mais afetados, em relação à perda de massa, os rins e o fígado.

Músculos e Tendões

O envelhecimento altera músculos e tendões. No músculo, há perda de massa muscular com diminuição do peso, da área de secção transversal e do número de células. Muitas células atrofiam e morrem; outras são substituídas por tecido adiposo e conjuntivo, ocorrendo um aumento do tecido adiposo e do colágeno intersticial na musculatura do idoso. No tendão, há aumento do comprimento e diminuição da área de secção transversal, o que induz uma redução da resistência tendinosa com o aumento da idade.
A perda de células musculares com a idade depende do grau de atividade física que o indivíduo exerce, de seu estado nutricional e do aspecto hereditário. Os diferentes músculos sofrem o processo de atrofia de modo diferente no mesmo indivíduo. É importante destacar que o declínio muscular é maior nos membros inferiores, o que compromete o equilíbrio, a marcha e a ortostase.
Os discos intervertebrais são articulações constituídas por um núcleo pulposo e um anel fibrocartilaginoso. No idoso, o núcleo pulposo perde água e proteoglicanos e suas fibras colágenas tornam-se espessas e em maior número. No anel fibroso, ocorre o contrário, há perda de células, depósito de cálcio e as fibras colágenas espessas tornam-se mais delgadas. Todas essas alterações fazem a espessura do disco intervertebral diminuir, acentuando-se as curvas da coluna, contribuindo para a cifose torácica, muito comum entre os idosos e mais freqüentes nas regiões cervical e lombar.
Nas articulações sinoviais, são observadas alterações importantes com o envelhecimento. A cartilagem torna-se mais delgada, surgem rachaduras e fendas na sua superfície, uma vez que, com o envelhecimento, diminui o número de condrócitos, água e proteoglicanos, enquanto as fibras colágenas aumentam em número e espessura. Essas alterações ficam mais freqüentes com o avançar da idade.
As alterações mais importantes do envelhecimento ocorrem no cérebro. O cérebro diminui de volume e peso. Nota-se ema redução de 5% aos 70 anos e cerca de 20% aos 90 anos de idade Ocorre certo grau de atrofia cortical, com conseqüente aumento volumétrico do sistema ventricular, que é bem evidenciado pelo estudo tomográfico.
A redução da massa encefálica está associada à perda neuronal, que não é uniforme em todas as áreas cerebrais. Essa perda ocorre especialmente no córtex dos giros pré-centrais, que é a área motora voluntária, giros temporais e também no córtex do cerebelo.

Sistema cardiovascular

O aumento da rigidez arterial e conseqüente aumento da pós-carga pode ser considerado o principal marcador do envelhecimento do aparelho circulatório. O aumento da pós-carga repercute no aumento da pressão arterial sistólica, desencadeando uma série de modificações anatômicas no coração, como: hipertrofia ventricular esquerda, aumento do átrio esquerdo e alterações funcionais como a diminuição do enchimento ventricular no início da diástole e diminuição da distensibilidade do ventrículo esquerdo.

Função cardiovascular

O débito cardíaco pode diminuir em repouso, mas isso ocorre principalmente durante o esforço, tendo uma influência importante do envelhecimento por meio da diminuição: a) da resposta de elevação da freqüência cardíaca ao esforço ou outro estímulo; b) da complacência do ventrículo esquerdo, com retardo do relaxamento do ventrículo, com elevação da pressão diastólica dessa cavidade, levando à disfunção diastólica do idoso, muito comum e que se deve principalmente à dependência da contração atrial para manter o enchimento ventricular e o débito; c) da complacência arterial, com aumento da resistência periférica e conseqüente aumento da pressão arterial sistólica, com aumento da pós carga dificultando a ejeção ventricular; d) da resposta cronotrópica e inotrópica às catecolaminas; e) do consumo máximo de oxigênio ao exercício (VO2 máx) com o progredir da idade, que traduz a diminuição da capacidade do corpo em transportar oxigênio para os tecidos; f) da resposta vascular ao reflexo barorreceptor, com maior susceptibilidade do idoso a hipotensão; e g) da atividade da renina plasmática.

Sistema respiratório

Verifica-se uma alteração no controle da ventilação pulmonar. É observada uma menor resposta da freqüência respiratória às variações de PaO2, PCO2 e do pH sanguíneo. A elevação da freqüência cardíaca e da pressão arterial na hipoxemia, que é menor no idoso. Essas alterações tornam a pessoa idosa mais propensa a apresentar modificações da ventilação quando se associam afecções do sistema nervoso central ou drogas depressoras da respiração.

Modificações torácicas

O envelhecimento modifica a constituição e forma do tórax. Observam-se redução da densidade óssea e conseqüente redução e achatamento das vértebras; redução dos discos intervertebrais; calcificação das cartilagens costais e das articulações costo-esternais. Essas modificações determinam o enrijecimento da caixa torácica, tornando mais importante a ação da musculatura abdominal e diafragmática na ventilação.
O achatamento da coluna vertebral e conseqüente cifose torácica, mais evidente no gênero feminino, determina um aumento do diâmetro antero-posterior e redução do diâmetro transverso, o que caracteriza o tórax senil.
A musculatura da respiração enfraquece com o progredir da idade, assim como os músculos esqueléticos em geral, o que, somado ao enrijecimento da parede torácica, resulta na redução das pressões máximas inspiratórias e expiratórias com um grau de dificuldade maior para executar a dinâmica respiratória. O único músculo que parece não ser afetado pelo envelhecimento é o diafragma que, no idoso, apresenta a mesma massa muscular que indivíduos mais jovens.

Vias aéreas e pulmões

A via aérea extra-pulmonar, que corresponde à traquéia e a sua bifurcação, torna-se mais rígida por calcificações e aumenta de diâmetro, resultando em aumento do espaço morto. As vias pulmonares, principalmente as de menor calibre, tornam-se mais frouxas, colabando-se facilmente, contribuindo para o aumento do volume residual.
Os bronquíolos respiratórios, ductos alveolares, sacos alveolares e alvéolos tornam-se progressivamente maiores, com predomínio do aumento dos ductos, “ductoectasia”, diferenciando esse processo do enfisema. Essa dilatação causa compressão e redução do volume alveolar e tem como conseqüência redução da superfície alveolar de 75m2 aos 30 anos para 60m2 aos 75 anos de idade.
Nos pulmões, observa-se redução de peso de aproximadamente 20% entre os 30 e os 80 anos. Sua complacência encontra-se reduzida. A menor força de retraimento pulmonar e menor capacidade de expansão torácica acabam por determinar menor pressão negativa intrapleural e conseqüente menor distensão dos alvéolos e pequenas vias aéreas.
A alteração da complacência pulmonar é conseqüência, principalmente, das modificações dos sistemas colágeno e elástico. O colágeno é a proteína predominante no pulmão e corresponde a cerca de 15% do seu peso seco. Com o envelhecimento, há um aumento na quantidade de colágeno e alterações degenerativas nas fibras elásticas.

Função Pulmonar

O envelhecimento no sistema respiratório acaba resultando na redução da reserva fisiológica respiratória que se traduz pelas seguintes alterações: a) o espaço morto anatômico aumenta, comprometendo a eficiência das trocas gasosas, aumentando o trabalho; b) volume corrente (VC) encontra-se levemente diminuído ou normal em repouso; c) a capacidade vital (CV) diminui 20mL/ano; d) a capacidade residual funcional (CRF) e o volume residual (VR) aumentam, enquanto a capacidade pulmonar total (CPT) e o volume corrente (VC) pouco se alteram; e) a capacidade vital forçada (CVF) e o volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) reduzem-se, assim como ao relação VEF1/CVF (índice de Tiffeneau); f) ventilação voluntária máxima (VVM) diminui; g) pico de fluxo expiratório (peak flow) diminui; h) o fluxo expiratório forçado entre 25 e 75% da capacidade vital diminui.
As alterações citadas podem ser atribuídas à redução da pressão de recolhimento, secundária à redução da elasticidade pulmonar e da complacência torácica, com conseqüente colabamento e fechamento precoce das vias aéreas durante a expiração normal e, principalmente, forçada.
A ventilação alveolar e perfusão capilar também são afetadas no idoso. Nota-se uma redução de ambas, com queda progressiva na pressão parcial de oxigênio no sangue arterial, que ocorre com o avançar da idade.
A difusão alvéolo-capilar diminui a partir dos 40 anos de idade em conseqüência das alterações da ventilação alveolar e da perfusão capilar, da redução da superfície de trocas gasosas e ao aumento do tecido conectivo intersticial. A capacidade do corpo em transportar oxigênio para os tecidos (VOmáx) também reduz com a idade.
A redução da sensibilidade do centro respiratório, a hipóxia ou a hipercapnia diminui a resposta ventilatória nos casos de infecções, agravamentos de obstrução de vias aéreas ou insuficiência cardíaca.

Autora: Drª Miriam Gondim Meira Tibo